7 de set. de 2012

Depuração Introspectiva por Renovado Aprendizado.


Algumas obras nos obrigam renovadas leituras em fases posteriores de nossas vidas para que possamos perspectivar horizontes antes não vislumbrados. Tais obras têm na releitura a possibilidade de um novo aprendizado particular ou uma compreensão que anteriormente ou não éramos capazes de apreender ou que não estávamos dispostos a sequer considerar. “Les Misérables” (Os Miseráveis), obra escrita pelo francês, poeta, ativista pelos direitos humanos, dramaturgo, ensaísta, novelista, artista, estadista, Victor-Marie Hugo (1802 - 1885), é uma destas sempre “determinantes” e “depurativas” obras.

O trabalho em referência, cercado de misticismo e fantasia, engendrado com o que de melhor pode existir na arte da escrita, exibe, felizmente, o caráter social lamentável de uma época e denuncia as sempre injustiças que insistem em se proliferar continuamente e seguidamente na história do homem, mutilando a dignidade, acabando com o respeito e destruindo a fraternidade.

“Victor Hugo era um louco que se considerava Victor Hugo”. “Infelizmente, Victor Hugo foi o maior poeta da França”. “Victor Hugo era um surrealista genial e ao mesmo tempo um tolo sem antecessor”. Independentemente de como Victor Hugo seja considerado pelos seus admiradores ou detratores, sua influência persiste. Mas, em particular, seus “Les Misérables” incomoda, agride, oprime, pois ao escancarar a miséria no seu sentido absoluto, sem disfarces, exige de seus leitores renovadas e intensificadas reflexões sobre a dignidade humana roubada dos homens pelos próprios homens.

Considerado “o drama social e histórico do século XIX” a obra “Os Miseráveis”, embora, inquestionavelmente, constitua, também, uma produção literária de alto nível e sem igual, é fundamental, entretanto, para que os homens de distintas origens, de diferentes crenças e constituídos de diferenciadas morais abram os olhos sobre a miséria humana. Se esta obra pode ter um valor irmanado, de consenso, entre todos aqueles que a leram, é que a mesma obriga reconhecer, de forma compassiva e solidária, a miséria humana praticada ontem, hoje e sempre.

Embora, porém, existam excelentes traduções, nas mais distintas línguas, ler a obra na língua original em que foi escrita é sempre recomendado para não se correr o risco de perder parte alguma da essência, da filosofia (da razão suficiente) da obra. No caso muito particular de “Les Misérables” percebe-se que em outras línguas o estilo narrativo e descritivo perde um pouco da elegância e da riqueza características com que o autor francês dá vida a sua obra escrita em 1862.

Em outras línguas, que não a original, a redação, mesmo que, em muitas vezes seja esmerada, parece ser amenizada na intensidade psicológica quando comparada com o fausto barroco francês com o qual o implacável autor escreve, encanta e, ao mesmo tempo, aborrece (fere), castiga e oprime ao denunciar as injustiças vivenciadas na França do século XIX que, em maior ou menor intensidade, consciente ou inconscientemente, continuamos a reproduzir, nos dias atuais e em quaisquer lugares, de forma, também, miserável.

Carlos Magno Corrêa Dias 

Curitiba-PR, 07/09/2012