2 de abr. de 2020

Portal do Paraná em comemoração.


A história da colonização do Norte Pioneiro do Paraná está fortemente relacionada com a história da expansão da cafeicultura que tem seu início no Estado a partir de 1860 quando cafeicultores paulistas ultrapassam o Rio Itararé. No período chegam na região, também, algumas famílias de Minas Gerais. Porém, naqueles primórdios a colonização não ultrapassou o Rio das Cinzas aquele que é o principal curso de água doce do chamado Norte Pioneiro do Estado do Paraná.

O Rio Itararé, por sua vez, é um curso de água que divide os Estados de São Paulo e Paraná, nascendo na Serra de Paranapiacaba, ao sul de São Paulo.

Nas duas décadas seguintes ocorre, porém, um novo avanço significativo na colonização da região e, em particular, em 12 de novembro de 1888 era fundada a Fazenda da Prata a qual em 4 de julho de 1890 tornar-se-ia o Distrito de Nova Alcantara.

Mas, em 2 de abril de 1900, pela Lei número 522, começava, oficialmente, a história da cidade paranaense que é considerada o “Portal do Paraná”. Naquela data era criado o município de Nova Alcântara o qual, em 3 de março de 1903, pela Lei 471, passou a denominar-se Jacarezinho; sendo o nome Jacarezinho uma referência ao Rio Jacarezinho.

O Rio Jacarezinho banha hoje os municípios de Quatiguá, Joaquim Távora, Jacarezinho, Santo Antônio da Platina e Barra do Jacaré. O Rio Jacarezinho tem sua nascente no Município de Siqueira Campos, no Paraná, e sua foz no Município de Barra do Jacaré, também, no Paraná. É interessante observar que o Rio Jacarezinho desagua no Rio das Cinzas.

Jacarezinho tendo suas origens a partir do plantio e cultivo do café em terras do Paraná soube aproveitar os benefícios trazidos pelo chamado Ciclo do Café e passou a experimentar grande e rápido crescimento. O maior desenvolvimento da cidade se deu entre as décadas de 30 e 60. Com solo fértil, a terra roxa que é ideal para os cafezais, árduo e intenso trabalho transformou-se Jacarezinho em importante produtor de café do Brasil. Na década de 50 quando atingiu seu apogeu Jacarezinho passou a ser polo de desenvolvimento agrícola de toda a região Norte do Estado do Paraná.

Depois do Ciclo do Café no Brasil, a economia de Jacarezinho voltou-se para a cana de açúcar. Até hoje parte da economia da cidade ainda está associada à produção agrícola e agropecuária tendo grandes pastagens e usinas de cana-de-açúcar instaladas. A partir de 1970 incrementou-se, porém, a produção de soja, algodão e trigo.

Hoje Jacarezinho faz parte da mesorregião Norte Pioneiro do Estado do Paraná. O Norte do Paraná está dividido em três mesorregiões. Devido ao seu pioneirismo e muitas histórias de sucesso Jacarezinho se transformou em acervo histórico do Estado do Paraná e importante centro econômico e polo cultural.

Por outro lado, a cidade investiu, também, na Educação, Cultura e Arte e passando a ser famosa pelas suas Escolas e Faculdades Jacarezinho é referenciada como a “Capital Estudantil do Norte Pioneiro” do Paraná.

Atualmente Jacarezinho continua sendo centro de excelência em Educação Universitária e de Pesquisa do Estado do Paraná e do Brasil e tem importantes Instituições de Ciência e Tecnologia (ICT) instaladas tais como: UENP (Universidade Estadual do Norte do Paraná), TECPAR, IFPR, UAB, CCHE-CLCA (antiga FAFIJA), CCSA (antiga FUNDINOPI), CCS (antiga FAEFIJA), UNIBRAS, IAP (Instituto Ambiental do Paraná), IBGE, Departamento de Estradas e Rodagem (DER-PR), Parque Industrial, Sistema Fecomércio (Senac - Sesc), Sebrae, Ciee, BioFábrica, Sistema Fiep (Sesi – Senac), dentre outras.

É sempre importante ressaltar que em Jacarezinho contou com o o extraordinário Colégio Cristo Rei cuja história se integra à história do próprio município de Jacarezinho e do Norte Pioneiro do Paraná. O Colégio Cristo Rei foi, também, a Escola de formação de diversas personalidades importantes do Estado do Paraná e do Brasil.

A inauguração oficial do Ginásio Cristo Rei foi realizada em 19 de março de 1935 tendo sido criado pelo Bispo italiano Dom Fernando Taddey (1867-1940) e pelo Padre Palotino alemão Erasmo Raab. Para preservar o prédio do Colégio Cristo Rei, dado seu pioneirismo e qualidade na formação, este foi tombado como Patrimônio Histórico do Estado do Paraná em 8 de abril de 2015.

Dom Fernando Taddey foi o terceiro Bispo de Jacarezinho e era da Congregação da Missão. Foi ordenado Bispo de Jacarezinho em 29 de junho de 1927. Faleceu em Jacarezinho aos 73 anos no dia 9 de janeiro. Ao longo dos 13 de sua vida que dedicou à Diocese de Jacarezinho foi incansável para promover o desenvolvimento da cidade de Jacarezinho.

Além das ICT e do seu perfil para a difusão e desenvolvimento do estudo e da pesquisa Jacarezinho tem a majestosa Catedral Diocesana de Jacarezinho (Catedral Imaculada Conceição) a qual, além de imponente construção e de ser por si só uma bela obra de arte, guarda em seu interior um rico acervo artístico que foi tombado pelo IPHAN/PR (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Superintendência do Paraná).

O acervo artístico da Catedral de Jacarezinho é um tanto paradoxal uma vez que é constituído não de pinturas sacras como o tradicional recomendaria, mas é composto de arte mural modernista que traduziu as culturas, realidade e costumes dos anos de 1950 daquela cidade fazendo associação com os elementos sacros em alguma medida, mas não essencialmente.

De uma forma inovadora e ousada as pinturas murais no interior da Igreja registram, em grande parte, os próprios citadinos trabalhadores ou autoridades da cidade, sem disfarces, que posaram para representar diversas das personagens bíblicas. Até hoje familiares reconhecem seus antepassados naqueles murais.

As obras de arte da Catedral de Jacarezinho em forma de quadros murais cobrem cerca de 600m2 e integram literalmente as paredes da Catedral. Pórtico, Nártex (Átrio), Nave Principal e Naves Secundárias, Transpecto, Capela de São Sebastião, Capela do Santíssimo, Presbitério e Altar-Mór apresentam os quadros murais em referência.

O trabalho foi executado entre 1954 e 1957 pelo artista plástico porciunculense convidado Eugênio de Proença Sigaud (1899-1979) em colaboração com o, também, artista plástico botelhense José Waldetaro Moura e Dias (1935) que naquele período era um jovem morador de Jacarezinho.

Os painéis murais (quadros murais) foram elaborados pelos dois artistas sobre diferentes suportes e pintados a óleo com cores quentes sobre grandes planos que chegam a ter murais de até 15 metros de altura e com figuras de até 3 metros de altura. Um trabalho monumental cuja ousadia e intensidade sempre impressionam.

Cabe salientar que José Waldetaro Moura e Dias, católico, não apenas ajudou a pintar os quadros murais da Catedral de Jacarezinho como, também, sugeriu algumas das cenas no conjunto da obra.

Os dois pintores, o mais velho fluminense e o mais novo mineiro, conservaram uma forte amizade e mesmo depois dos trabalhos executados na Catedral se mantiveram em contato contínuo um com o outro até a morte de Eugênio de Proença Sigaud, em 1979, no Rio de Janeiro.

Eugênio de Proença Sigaud foi convidado para pintar a Catedral de Jacarezinho pelo seu irmão Dom Geraldo de Proença Sigaud (1909-1999) que na época era o Bispo de Jacarezinho.

José Waldetaro Moura e Dias, nascido em Botelhos, cidade de Minas Gerais, em 15 de dezembro de 1935, era residente em Jacarezinho e tendo estudado no Colégio Cristo Rei onde cursou o Primário e o então Ginásio desde cedo manteve relações de proximidade com Dom Geraldo de Proença Sigaud e com o Clero da Diocese de Jacarezinho, uma Circunscrição Eclesiástica da Igreja Católica no Estado do Paraná.

Segundo contou o próprio José Waldetaro Moura e Dias, foi Dom Geraldo de Proença Sigaud que primeiramente o indicou para auxiliar o irmão na realização do trabalho artístico da Igreja uma vez que reconheceu no jovem José Waldetaro Moura e Dias qualidades artísticas. Na época, com seus 19 anos, José Waldetaro Moura e Dias já se destacava em Jacarezinho com suas pinturas.

José Waldetaro Moura e Dias foi indicado para trabalhar nas pinturas da Catedral de Jacarezinho, também, pelo Padre Magno Sauter (1908-1959), que foi seu Professor de Matemática do então Ginásio Cristo Rei o qual foi por diversas vezes Diretor do mesmo Colégio. O Padre Magno Sauter, respeitado e reconhecido como importante Professor do Colégio Cristo Rei, sempre reconhecia em José Waldetaro Moura e Dias a qualidade do detalhe na elaboração dos desenhos que executava em suas aulas de Desenho e por tal particularidade teria fortemente recomendado o jovem para trabalhar nas pinturas da Catedral.

Dom Geraldo de Proença Sigaud, por sua vez, acreditava que associando o dom da pintura e o fato de ser católico José Waldetaro Moura e Dias poderia em muito contribuir e ajudar o irmão na obra da Catedral dado que Eugênio de Proença Sigaud se declarava ateu convicto.

Assim, José Waldetaro Moura e Dias ao mesmo tempo que aprendia com o mestre pintor Eugênio de Proença Sigaud e aprimorava sua técnica como artista plástico ajudava na execução da obra. José Waldetaro Moura e Dias chegou, também, a posar como modelo vivo para muitas das figuras em vários murais como, por exemplo, no Mural “o Sermão da Montanha”.

Eugênio de Proença Sigaud e José Waldetaro Moura e Dias tinham bem em comum a particular preferência pela arte figurativa e acreditavam na força que o fazer artístico possuía como função social. Semelhante afinidade os fez trabalhar em conjunto arduamente na elaboração daquela grande obra. Dois homens de temperamentos fortes e de crenças diferentes que se irmanaram num trabalho fantástico.

Dom Geraldo de Proença Sigaud (1909-1999), foi Bispo de Jacarezinho de 1947 a 1961 e Arcebispo Metropolitano da Arquidiocese de Diamantina de 1961 a 1980.

O mineiro de Belo Horizonte Dom Geraldo de Proença Sigaud, da Congregação do Verbo Divino, foi ordenado Bispo de Jacarezinho no dia primeiro de maio de 1947. Dentre seus feitos em Jacarezinho destaca-se, também, a criação da excelente Faculdade de Filosofia e Letras de Jacarezinho da qual foi seu primeiro Diretor, em 1960.

É sempre necessário salientar que, a despeito da aparente contradição (um ateu pintar as imagens no interior de uma Catedral) Eugênio de Proença Sigaud aceitou pintar aqueles murais, também, pelo desafio e pela oportunidade de ter sua pintura mural popularizada artística e politicamente.

Muitas são as histórias sobre a Catedral de Jacarezinho em si e sobre as pinturas em seu interior. Entretanto, pouco se sabe em detalhes ou muito ainda não foi divulgado. Todavia, deve-se enfatizar que as contribuições de José Waldetaro Moura e Dias para o conjunto da obra artística interna da Catedral Diocesana de Jacarezinho foram determinantes.

Há de se observar, por exemplo, que foi por sugestões de José Waldetaro Moura e Dias que algumas pessoas especificas da cidade foram escolhidas para serem retratadas nos murais por terem biotipos mais próximos de figuras bíblicas clássicas dado que José Waldetaro Moura e Dias, criado em família católica que bem conhecia a história do cristianismo, desde pequeno teve acesso às correspondentes imagens sacras.

A Catedral de Jacarezinho é monumental. Possui traços do estilo românico e foi edificada no formato de basílica com pilares. Tendo o formato em cruz a Catedral mede 67 metros de comprimento por 22 metros de largura.

O acervo artístico no interior da Catedral é formado por um conjunto de 43 (quarenta e três) pinturas murais emolduradas e um painel emoldurado em branco no qual figura alguma foi pintada naquele espaço.

Naquele espaço em branco era para ser pintado um mural representando a “Ressureição” o qual seria o último mural do conjunto. Todavia, ao que parece, devido a um desentendimento entre os dois irmãos o espaço ficou lá sem que fosse completado por nenhum dos artistas. Cada mural pintado, entretanto, conta uma história bíblica com visão modernista e que reflete a forte interação entre os dois pintores.

Além dos painéis pintados as paredes receberam, também, distintos ornamentos estilizados lembrando referências à simbologia cristã como peixes, estrela de Davi, ramos de palmeiras, flor de Liz, dentre outros. São identificados, também, ramos de café que estão lá para lembrar os gloriosos tempos da cafeicultura na região.

Eugênio de Proença Sigaud e José Waldetaro Moura e Dias seguiram caminhos distintos e se separaram após 1957. O primeiro retornou para o Rio de Janeiro e o segundo fixou-se depois em definitivo em Curitiba-PR, mas estas são outras histórias que oportunamente serão contadas.

Jacarezinho, entretanto, tem uma dívida eterna com Eugênio de Proença Sigaud e José Waldetaro Moura e Dias, sendo que a história não pode esquecer do incrível trabalho que estes dois homens fizeram.

Cabe salientar, entretanto, que foi Dom Ernesto de Paula (1899-1994), antecessor de Dom Geraldo de Proença Sigaud como Bispo de Jacarezinho, quem colocou a pedra fundamental da Catedral de Jacarezinho (ou Igreja Nossa Senhora da Imaculada Conceição ou Igreja de São Sebastião) no dia 19/07/1942, embora muito antes já se teria a intenção de se construir uma Igreja com o porte da Catedral atual.

A inauguração da Catedral, entretanto, foi realizada em 08 de outubro de 1949 por Dom Geraldo de Proença Sigaud mesmo ainda incompleta e tendo muito por fazer. O projeto inicial de construção da Catedral era para ser em estilo moderno, mas como o gosto de Dom Geraldo de Proença Sigaud tendia mais para estilo colonial foram feitas algumas modificações na arquitetura original, mas somente naquilo que era possível mudar.

Cabe ressaltar, também, que as imagens (estátuas) que fazem parte da Catedral de Jacarezinho são de autoria do escultor espanhol Silvestre Blasco e Vaqué (1887-1977) que viveu e trabalhou no Chile, Argentina e Estados Unidos e que, entre 1955 e 1961, estabeleceu-se em Jacarezinho.

Silvestre Blasco e Vaqué, sobre quem pouco se conhece, elaborou, também, as esculturas da Capela do Palácio Episcopal de Jacarezinho. Em ambos os locais suas esculturas fogem, também, ao tradicional das figuras sacras. Aquelas estátuas apresentam um excesso de vestes e parecem mais corpos de seres humanos que de santos, causando, notadamente, inconformismo entre os citadinos de Jacarezinho na época.

Seguindo a tradição espanhola são verificadas nas estátuas da Catedral de Jacarezinho os princípios do verismo e da expressividade emocional de forma que se assemelham (intencionalmente) muito com pessoas embora exista, também, uma áurea de leveza e santidade naquelas obras. Muitas pessoas da cidade da época foram reconhecidas naquele estátuas.

Mas, pelas diversas características especiais da Catedral Diocesana de Jacarezinho aquela bela obra de arte é considerada uma das principais obras arquitetônicas do Norte Pioneiro e do Brasil tendo sua história confundida, também, com a história da própria cidade de Jacarezinho e do Norte Pioneiro do Paraná.

Jacarezinho tem uma riqueza cultural e histórica fantástica que necessita ser mais intensamente contada para ser conhecida pelas atuais e futuras gerações.

Que 2 de abril, data do aniversário de Jacarezinho, da “Capital Estudantil do Norte Pioneiro” do Paraná, do "Portal do Paraná", possa ser celebrado com júbilo a cada ano. Parabéns Jacarezinho.

Carlos Magno Corrêa Dias
02/04/2020