3 de ago. de 2013

Na “Montanha do Rei” é Registrada Transição entre os Medievais e o Renascimento.


Não constitui exagero afirmar que a Idade Média continua, mesmo nos dias presentes e diante dos avanços tecnológicos, a nos surpreender em vários campos do saber e, talvez, mais intensamente no campo da Filosofia da Ciência. Em particular, entretanto, como já ponderado, são notáveis (imprescindíveis) as contribuições para as Ciências Exatas dos formidáveis medievais Boécio (c. 480 - 525/26), Fibonacci (c. 1180 - 1250) e Regiomontano (1436 - 1476).

Em oportunidades anteriores já tive a grata satisfação de discorrer publicamente, em específico, sobre os dois primeiros pensadores e evidenciar, nem tanto suas contribuições, mas, principalmente, a mentalidade dos mesmos para a promoção da Ciência.

Motivado pela importância que reconheço nos mesmos para a manutenção da linha de continuidade do conhecimento já elaborei alguns textos “apologéticos” nos quais chamo a atenção para os três medievais referenciados os quais considero a “tríade” principal de pensadores da Idade Média para disseminação do conhecimento lógico e formal.

No último dia 02/08/2013, com título semelhante ao deste artigo, expus considerações que objetivaram resgatar a importância do astrólogo, cosmógrafo e matemático Johann Müller Königsberg, conhecido pelo nome de Regiomontano (que corresponde à forma latinizada de sua cidade natal Königsberg e denominação que significa, literalmente, “montanha do rei”).

Como Anício Mânlio Torquato Severino Boécio (ou simplesmente, Boécio) é tomado como um agente de transição entre a Antiguidade e a Idade Média, Regiomontano é o “agente de transição" entre a Idade Média e o Renascimento, uma vez que o conjunto de sua obra (elaborada na Europa cristã e escrita em latim) sinaliza a “nova era” que se principiava.

Seguindo, então, semelhante linha de posição, apresentei breve exposição levando em conta as principais contribuições de Regiomontano; começando por evidenciar que o mesmo fora um notável fabricante de instrumentos, impressor e cientista. Seus trabalhos na tradução e publicação dos manuscritos clássicos de matemática foram determinantes para a continuidade do desenvolvimento do conhecimento. Além do que são reputados a Regiomontano os notáveis progressos realizados na Trigonometria e na Astronomia no correspondente período.

Regiomontano estudou nas universidades de Leipzig e Viena, onde adquire o conhecimento do grego e passa a manter contato com as diversas correntes do pensamento científico e filosófico da época. Regiomontano se impôs a tarefa de adquirir, traduzir e publicar o legado científico da Antigüidade. Em 1471 se estabeleceu em Nuremberg, onde construiu um observatório, instalou uma prensa tipográfica e escreveu alguns trabalhos de astronomia. Consta que o estabelecimento da impressora e do observatório em Nuremberg objetivava, acima de tudo, estimular a ciência e a literatura. Regiomontano continuou e completou a tradução do Almagesto de Cláudio Ptolomeu (90 - 168), traduzindo, também, Apolônio (262 a.C. - 194 a.C.), Herão (10 - 70) e Arquimedes de Siracusa (287 a.C. - 212 a.C.).

Por volta de 1464, Regiomontano escreveu o seu mais importante tratado o qual intitulou-se De triangulis omnimodis libri quinque, que fora publicado somente em 1533. Uma tal obra corresponde à primeira exposição européia sistemática sobre trigonometria plana e esférica, cujo tratamento é independente da astronomia. O De triangulis constitui-se numa introdução completa à trigonometria, diferindo dos nossos textos atuais, basicamente, porque a nossa notação ainda não existia. Além do De triangulis omnimodis constituir um dos grandes tesouros da humanidade, há de se salientar que Regiomontano é tido como o primeiro pensador a organizar a trigonometria como disciplina independente da astronomia.

A despeito da imprescindível contribuição de Regiomontano à trigonometria saliento que sua álgebra, tanto quanto a dos árabes, era retórica. Efetivamente, a influência de Regiomontano em álgebra não foi das maiores. O conjunto de sua obra lançou, entretanto, as condições necessárias para os desenvolvimentos futuros.

Em 1475, Regiomontano tinha sido convidado pelo Papa para participar da reforma do calendário. Contudo, pouco depois de sua chegada em Roma, morreu súbita e prematuramente aos 40 anos de idade. Seu falecimento, até hoje, encontra-se cercado de mistério. Alguns relatos pretendem mostrar que Königsberg morreu provavelmente vitimado pela peste; porém, existem evidências de que foi envenenado por um inimigo.

A lista dos livros que Regiomontano pretendia imprimir se preservou e, em dada medida, um caminho para a preservação do conhecimento e futuros desenvolvimentos ficaram sinalizados. Porém, certamente, se Regiomontano não tivesse morrido tão cedo seus trabalhos haveriam de alterar significativamente os caminhos seguidos pela humanidade para a sua continuidade e desenvolvimento.

Depois de apresentar série de particularidades sobre a transição aventada termino a apresentação por observar que sem a mentalidade, a postura ou as efetivas contribuições do notável medieval Johann Müller Königsberg não teríamos, certamente, a Ciência que hoje desfrutamos.

Carlos Magno Corrêa Dias
03/08/2013